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Alessandra Corrêa

Lidando com as emoções – nossas e do outro – em negociações, tomadas de decisão e conflitos em geral.

Atualizado: 24 de jul.

Lições de Roger Fisher, Daniel Shapiro e William Ury.




 

Somos impactados positiva e negativamente por nossas emoções. Elas provocam pensamentos, mudanças fisiológicas e nos impulsionam a agir. Muitas vezes falamos, agimos e tomamos decisões sem nos darmos conta de que estamos sendo influenciados por nossas emoções.


 “Não faça promessas quando estiver feliz, não discuta quando estiver com raiva, não tome decisões quando estiver triste”, diz a sabedoria popular. Não podemos evitar as emoções e nem as ignorar. Analisar cada emoção à medida em que surgem é difícil e pode nos distrair e tirar nosso foco do nosso objetivo. O que fazer, então?


William Ury nos diz que é preciso “ir para o camarote” (“go to the balcony”). Ele nos ensina a imaginar que somos atores em uma peça de teatro e quando percebermos uma alteração, em nós mesmos ou nos outros, devemos nos imaginar no camarote, assistindo à peça. Isso nos dá o distanciamento necessário para tomar uma decisão sobre como agir. Nos ajuda a não termos reações impulsivas e manter a qualidade do nosso processo decisório.


Ury também nos diz que por trás de cada emoção há uma necessidade não atendida.


Roger Fisher e Daniel Shapiro vão um pouco mais fundo nessa questão. Eles nos dizem que há cinco principais interessesque são necessidades comuns a todos nós e que estão quase sempre presentes.


Esses cinco interesses estimulam emoções positivas quando atendidos e emoções negativas quando negligenciados. Os cinco interesses são: apreço, associação, autonomia, status e papel.


Quando temos nossos sentimentos, nossas ideias, opiniões e ações são reconhecidas e valorizadas, nos sentimos apreciados. O interesse da associação é atendido quando somos tratados como um membro do grupo em questão, quando há uma sensação de parceria, de trabalho para um objetivo em comum, de conexão com o outro. Quando temos liberdade para tomar decisões, nossa autonomia está sendo respeitada. Sempre que nossa posição é definida e apreciada, nosso status está sendo respeitado. Se nossas atividades são gratificantes, nossa necessidade por um papel está sendo atendida.


Quando uma ou mais necessidades principais não são atendidas, muitas emoções podem ser suscitadas. Podemos nos sentir irritados, ansiosos, envergonhados, tristes... e em consequência, sem nem mesmo perceber, podemos ser levados a:


  • Ter uma reação mais impulsiva e ir contra nossos próprios interesses.

  • Nos isolar e deixar de buscar ajuda e opiniões que possam enriquecer e facilitar nosso trabalho, e nos sobrecarregar.

  • Nos tornar inflexíveis em nossas opiniões e posições.

  • Perder a confiança nas pessoas com quem estamos interagindo.


O lado bom é que quando essas necessidades são atendidas, diversas emoções positivas são estimuladas, o que nos leva a nos tornarmos mais cooperativos, mais criativos, mais confiantes e confiáveis.


Podemos utilizar os cinco principais interesses descritos por Shapiro e Fisher de três formas, em três momentos do conflito:


  1. Para cultivar um bom relacionamento e diminuir as chances de conflito – nutrindo sempre os cinco interesses nos outros e cuidando para que eles estejam bem nutridos em nós.

  2. Para diagnosticar as causas de um conflito ou da escalada de um conflito – qual ou quais dessas necessidades não estão sendo atendidas?

  3. Para ajudar a resolver um conflito ou desescalar um conflito.


Vamos ver cada um dos interesses com um pouco mais de detalhe.


Apreço


Todos nós gostamos de nos sentir apreciados. Saber os outros reconhecem méritos em nossos pensamentos, sentimentos e em nossas ações.


Para isso, é importante buscar entender o ponto de vista do outro. Não é necessário concordar, mas compreender e procurar méritos em suas ideias, em seus sentimentos e em suas ações. Cumpridas essas duas etapas, é essencial expressar esse apreço.


Duas questões importantes:


O primeiro é sobre sinceridade: ser sincero é essencial. Mentir não á uma boa alternativa, pode corroer a confiança que as pessoas têm em você e estragar a relação e sua reputação.

O segundo é menos óbvio. Muitas vezes precisamos buscar entender a perspectiva do outro de forma ativa. Muitas vezes essa compreensão não vem de forma automática ou intuitiva, por isso fazer esse exercício é importante e deve fazer parte da preparação para conversas difíceis e negociações.


Associação


De acordo com os autores, associação é “nossa ligação com uma pessoa ou um grupo”. É uma necessidade que, quando suprida, facilita a colaboração, pois ao gerar uma sensação de proximidade com o outro, ajuda a quebrar certas barreiras na comunicação, aceitação de ideias e na cooperação em geral.


Confiamos mais em quem pertence a nosso grupo. Gostamos mais de quem pertence a nosso grupo. Concordamos e cooperamos mais com quem pertence a nosso grupo. E basta encontrarmos algo em comum com a pessoa com quem estamos lidando para que uma sensação de “nós” seja criada.


Claro que aqui também vale o aviso de que é preciso ser sincero. Tom de voz, linguagem corporal, e muitos outros fatores denunciam a falta de sinceridade, e lá se vão a confiança e a reputação.


Os assuntos conversados naquele warm up antes da reunião, a frequência do contato e o tipo de contato – contato pessoal ou não – também contribuem para a construção da associação. Quanto mais próxima for a interação, maior a sensação de associação.

Conversar sobre temas mais pessoais e fugir dos assuntos mais seguros como clima, trânsito e afins. Não precisamos falar sobre assuntos muito pessoais, mas podemos falar sobre uma viagem de férias, uma experiência que tivemos ou compartilhar alguma opinião pessoal sobre um tema atual.


Sempre que possível podemos trocar a mensagem de texto pelo telefonema, o telefonema por uma chamada com vídeo e uma chamada com vídeo por um encontro presencial.


Autonomia


Muitos de nós já tivemos a sensação de termos nossa autonomia desrespeitada quando decisões foram tomadas a nossa revelia. Sermos comunicado sobre uma decisão da qual deveríamos ter feito parte nos leva a ter menos confiança nas pessoas envolvidas e no processo em si. Nossa disposição para aceitar ideias vindas destas pessoas e ajudar na implementação do acordo ou projeto resultante dessa decisão também diminui consideravelmente.


O desrespeito a autonomia corrói o espírito de grupo, de cooperação e pode levar a não implementação de bons projetos e acordos.


Ouvir frases como “Não estava sabendo disso”, “Não me consultaram” são sinais de alerta de dificuldades se aproximando e/ou de um conflito em formação.


Mesmo quando temos autoridade para tomarmos decisões, é sempre melhor incluirmos as pessoas que serão afetadas por elas. Isso não significa que todos devem participar ativamente da tomada de decisão. Podemos simplesmente consultar antes de decidir, dar transparência ao processo decisório.


Claro que no dia a dia nem sempre temos tempo para incluir todo mundo. Os autores trazem uma ótima sugestão: entrar em acordo prévio sobre alçadas, que eles chamam de baldes.


Algumas decisões, de menor importância, vão para o balde informar e devem ser informadas aos interessados após serem tomadas.


Outras, mais importantes, entram no balde consultar e, depois, decidir. Para esse tipo de decisão, os interessados devem ser consultados previamente, suas ideias e sugestões devem ser levadas em consideração para a tomada de decisão.


E, por fim, as grandes decisões que devem ser tomadas em conjunto, e vão para o balde acordo conjunto.


O respeito a autonomia é crucial na construção de acordos duradouros e devemos sempre nos atentar para respeitá-la.


Status


Status é relativo, ele indica a posição que temos em comparação a outras pessoas. Todos queremos ter status, pois ele contribui para nossa autoestima e para a forma como os outros nos veem e nos tratam.


Para nos ajudar a reconhecer o status dos outros, os autores fazem a distinção entre dois tipos de status: o social e o específico.


Fama, nível de importância na sociedade, títulos são indicadores de status social. Nossa cultura nos diz quem são as pessoas de grande status social, ninguém precisa nos dizer. Esse é o status social. Tendemos a prestar mais atenção e a dar mais importância ao que vem de pessoas com alto status social.


Nossa experiência, formação ou nível de conhecimento sobre um determinado assunto nos traz o status específico.


Reconhecer o status dos outros e ter o nosso reconhecido, é importante e pode ajudar muito na comunicação e na construção da relação necessária para que a negociação, acordo ou projeto siga de forma positiva e eficiente.


Papel


O papel é importante para todos nós, saber que estamos contribuindo e que fazemos parte de algo maior. Ninguém quer ser “café-com-leite”, todos queremos exercer um papel gratificante nos projetos, nas negociações e nas construções de acordos de que participamos.


Quando não temos um papel gratificante, podemos nos sentir frustrados, irritados e ressentidos. E o contrário ocorre quando desempenhamps um papel que tenha importância para nós, com atividades gratificantes.


É importante garantir que nós e os outros estejam exercendo papeis gratificantes.

Não temos como fugir das nossas emoções ou evitá-las. Não tem como separar o emocional do racional, eles andam juntos. Mas podemos usar as emoções de forma positiva, para evitar, diagnosticar ou resolver conflitos.



Por Alessandra Corrêa


Texto originalmente publicado no blog da HEAD Energia.

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